Era Domingo de Ramos e, como pedem as instruções do missal para este dia, eu havia acabado de enfeitar a cruz do presbitério com galhos verdes. Ao terminar, olhei para a Igreja vazia e foi como se todo o vazio daquele templo repentinamente entrasse no meu coração.

Eu sempre fui apaixonado pela Liturgia da Igreja Católica. Desde muito cedo servi como coroinha e ficava buscando o sentido divino de cada pequeno gesto que via e fazia nas celebrações. A fumaça do incenso, as reverências, o silêncio, tudo executado com temor e beleza, despertando o coração da assembleia para Deus. De tempos em tempos me voltava à cabeça aquela lição das primeiras catequeses: “Liturgia é um serviço em favor do povo” (CIC, n. 1.069). Mas, naquele Domingo de Ramos, o povo não estaria ali. Foi o que eu pensei, de início, mas eu rapidamente percebi que estava errado.

Isso porque, em primeiro lugar, eu sou Povo de Deus e eu estava ali. A fé que professamos na comunhão dos santos nos assegura que, se todos que creem formam um só corpo, os bens de uns são comunicados aos outros (CIC, n. 947). Através desta comunhão mística e sublime, a minha participação naquela missa, assim como a de cada um que ali estava, podia se dilatar para ir muito além de nós mesmos. Todos tínhamos consciência disso, o que era perceptível nas lágrimas que várias vezes escorreram pelos rostos daqueles poucos membros do nosso corpo comunitário que ali estavam. Sabíamos, mais pela fé do que pela razão, que a Liturgia era pelo nosso povo e que o nosso povo estava conosco.

Essa comunhão espiritual se manifestou também na comunhão dos muitos dons que o Espírito Santo concedeu para este tempo. Em menos de uma semana todos viramos câmeras, escritores, youtubers, especialistas em áudio e tudo mais que foi necessário. Há pouquíssimo tempo nossa Pastoral da Comunicação não tinha ninguém minimamente treinado para operar câmeras profissionais e programas de transmissão de vídeo. Mas Deus providenciou! Nesta Semana Santa vivemos um pouco aquela descrição das primeiras comunidades cristãs, cada um deu daquilo que tinha e recebeu do que não possuía, não retivemos nada para nós mesmos.

Da minha parte, foi especialmente difícil tentar transpor, ao máximo possível, a experiência da Liturgia da Semana Santa para uma transmissão. Em Liturgia, muito se fala no silêncio, no gesto, na contemplação. A Pastoral da Comunicação provavelmente já não aguentava mais as insistentes observações que fazíamos pedindo “mostra esse detalhe”, “mostra aquele gesto”, “mostra que a cruz está enfeitada como ramos”… Era uma santa insistência, acolhida com amor pelos operadores da tecnologia, na tentativa de fazer com que não faltasse aos olhos do nosso povo a beleza do mistério celebrado.

A experiência da Liturgia em tempos de pandemia torna evidente aquilo que é celebrar: é comunhão, é amor, é serviço… Quando enfim voltarmos aos nossos templos, para celebrar com toda a alegria e esplendor que o culto a Deus merece, não podemos esquecer a lição deste tempo. A Liturgia se constrói de dentro da pra fora. Ela precisa brotar do coração do povo em direção a Deus.

Santa Maria, Rainha da Igreja, rogai por nós!